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Durante o juramento de Hipócrates, ato solene feito por médicos na sua formação, profissionais de saúde prometem guardar máximo respeito e dignidade pela vida humana dos pacientes. No entanto, as falas não são seguidas por todos. Em 2016, a população do Distrito Federal ficou chocada ao ter ciência das denúncias contra a “Máfia das Próteses”, grupo criminoso acusado de fraudar planos e mutilar pacientes submetidos a cirurgias desnecessárias com materiais de baixa qualidade.
Com a divulgação das acusações, centenas de vítimas do esquema procuraram a polícia para prestar depoimento. Os relatos incluem mutilações e tentativa de homicídio, segundo consta no inquérito. O grupo teria movimentado milhões de reais em cirurgias, equipamentos e propinas. Estavam envolvidos empresários, médicos, enfermeiros e outros profissionais.
Em meados de 2020, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) condenou 12 réus da “Máfia das Próteses”. Muitos seguem livres e continuam atendendo em hospitais e clínicas da capital federal. Há casos, inclusive, de condenados que seguem trabalhando na saúde pública do DF.
Sammer Oliveira Santos, que trabalhava na empresa de fornecimento órteses, próteses e materiais especiais (OPMEs), foi sentenciada a uma pena de 3 anos e 9 meses de reclusão em regime aberto. A mulher chegou a admitir o esquema criminoso em uma delação premiada.
O Metrópoles apurou que, atualmente, Sammer Oliveira Santos é servidora ativa da Secretaria de Saúde do DF (SES-DF) atuando como enfermeira em centro obstétrico dentro de uma unidade pública de saúde. Ela é funcionária pública desde 2018 e recebe uma remuneração básica bruta de R$ 14.489,31.
Durante sua delação, a enfermeira admitiu que por orientação de um dos sócios havia uma combinação entre empresas para fazer a cotação das órteses, próteses e outros materiais especiais (OPMEs). De acordo com ela, essas empresas eram indicadas apenas para “fazer número”.
[DEFESA SAMMER]
No decorrer das investigações que deram origem à operação Mister Hyde, a Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) precisou prender um servidor da própria corporação. Na decisão de 2020, Marco de Agassiz Almeida Vasques foi condenado a 4 anos e 6 meses em regime fechado por organização criminosa.
Mesmo assim, ele segue como como médico-legista lotado na policlínica da PCDF. De acordo com o Diário Oficial do DF (DODF), no final do ano passado, o servidor chegou a ocupar o cargo de gerente de Perícias Médicas por um curto período de tempo. A remuneração básica dele gira em torno de R$ 25 mil.
Como a defesa do perito recorreu da decisão em 1ª grau, o processo está em fase de recurso no TJDFT, portanto não houve trânsito em julgado. O Metrópoles conseguiu entrar em contato com o advogado do médico.
A defesa alega que Marcos continua trabalhando porque foi absolvido no Processo Administrativo Disciplinar (PAD) aberto sobre o caso. “Ele foi absolvido, primeiro, ao fundamento de que não havia nenhuma relação entre essas acusações com a atuação dele na Polícia Civil. As acusações dizem respeito à atuação dele enquanto médico privado”, argumenta o advogado Marcelo Leal.
Ele informa também que o PAD foi arquivado, pois testemunhas ouvidas comprovaram o “contrário” do que foi exposto nas denúncias. Inclusive, segundo a defesa do homem, haveria depoimentos de “delatores que desdizem o que haviam dito anteriormente”.
Outro ponto levantado pela defesa é de que o simples indicativo de formação de organização criminosa sem apontar outros crimes: “Como é que existe uma organização criminosa que não praticou crime nenhum? O Ministério Público do DF abriu inquéritos para investigar os supostos crimes praticados pela organização criminosa e não ofereceu nenhuma outra denúncia. Significa que chegou-se à conclusão que não teve crime praticado”.
“Marco Agassiz é inocente e, por isso, foi absolvido administrativamente, não havendo qualquer impedimento para que exerça suas funções na Polícia Civil. Quanto à condenação de primeira instância, esta defesa aguarda com serenidade o julgamento do recurso de apelação, na certeza de que sua inocência será reconhecida pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal”, finaliza Leal.
Segundo a investigação dos promotores e dos policiais civis, o grupo usava os procedimentos cirúrgicos para ganhar cada vez mais dinheiro. Entre as pessoas presas na Operação Mister Hyde, estão médicos e representantes de empresas fornecedoras de órteses, próteses e materiais especiais (OPMEs). O esquema teria movimentado milhões de reais em cirurgias, equipamentos e propinas.
Há casos de pacientes que foram submetidos a procedimentos desnecessários, como sucessivas cirurgias, para que gerassem mais lucro aos suspeitos. Em outros, conforme revelado pelas investigações, eram utilizados produtos vencidos e feita a troca de próteses mais caras por outras baratas.
Além dos pacientes, muitos dos quais sofreram sequelas provocadas pelas lesões intencionais, outro alvo do esquema são os planos de saúde, que acabavam pagando mais caro por uma cirurgia que não necessitaria de órteses ou próteses. A propina geralmente era paga por depósito nas contas dos médicos ou então entregues em espécie nas proximidades dos hospitais onde ocorrem as cirurgias.
O Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) ressaltou que segue atuando nas denúncias referentes ao caso da “Máfia das Próteses” tanto em novas denúncias que surgirem quanto na fase recursal, realizada pela procuradoria de justiça.
Questionado sobre a atuação da enfermeira Sammer Oliveira Santos, a Secretaria de Saúde do DF (SES-DF) informou apenas que colabora com as investigações e, sempre que solicitada, fornece informações aos órgãos competentes e dentro dos autos do processo. “A pasta esclarece que não comenta processos internos relacionados a servidores”, indicou o órgão.
A Polícia Civil do DF (PCDF), por sua vez, comentou que o caso de Marco de Agassiz Almeida Vasques já foi jucidializado e não questiona decisões judiciais.